Entre maio e julho de 2017, eu parei um pouco meus estudos de direito administrativo, constitucional e afins, para me dedicar a um livro que influenciava muito vários dos relatórios de investimentos que eu lia. A Lógica do Cisne Negro de Nassim Taleb traz um conceito muito contrário a toda a ideia de Self-Reliance de Ralph Waldo Emerson, que é "ideia-mãe" de todo os livros de auto-ajuda que trazem Psicologia Positiva, dos quais se pegarmos "Os Sete Hábitos", como exemplo por excelência, traduz que a iniciativa pessoal é o princípio da organização e da administração, porque cada pessoa só consegue controlar diretamente o que está ao seu alcance direto, um universo disponível que pode ter um impacto razoável na vida da própria pessoa se bem utilizado.
Em "Cisne Negro" (vou abreviar para o nome original), Taleb argumenta que o efeito de eventos improváveis em nossas vidas tem um impacto muito maior do que qualquer outra coisa. Tem um filme muito bom, Remember Me, que mostra de maneira muito forte o impacto de um Cisne Negro. Seguem exemplos, segundo minha interpretação:
1. A crise econômica de 2008
2. O impeachment no Brasil em 2016
3. A popularização do Uber, que reposicionou o negócio dos táxis.
4. A Netflix e os serviços de streaming.
5. O fortalecimento dos bancos digitais
6. O fenômeno de MGLU3 na B3
7. Várias mortes em House of Cards
8. O estalo de Thanos em Guerra Infinita
9. As várias reviravoltas de Ultimato (só para citar algumas Hail Hydra, Passagem do Escudo, as mortes, Loki pegando a joia)
10. O personagem principal morrer em seu próprio jogo (sem spoilers aqui, blz).
As características em comum desses eventos é alto impacto e o entendimento de que havia baixa probabilidade de acontecer. Apesar das pessoas alegarem que já sabiam de alguns eventos antes de eles acontecerem e inventarem mil histórias de como existiam fortes evidências e tal (viés de retrospectiva), as mesmas acabam não se preparando adequadamente para isso, ou seja, no fundo elas mesmas acreditavam que não valia a pena gastar tempo e energia tomando precauções. Mas é claro que gostaria de ouvir da pessoa que lê, se ela discorda que é um cisne negro e o porquê!
Pois bem, Taleb propõe uma estratégia para lidar com isso, a farmosa Barbell Strategy!
A base do pensamento talebiano é muito ancorada em propagação de erros. Para quem fez Exatas, vocês lembram daquela equação? Pois bem, as teorias econômicas são tão repletas de erros, que os modelos simplesmente são muito frágeis, fazem muito pouco sentido. Assim sendo, para um investidor a esmagadora maior parte do portfolio deveria estar em investimentos extremamente seguros e um parte muito pequena deveria estar bastante diversificada e em investimentos que sejam os mais agressivos possíveis (muito risco, porém muito retorno). Algo como:
A. 99% tesouro SELIC, 1% BOVA11
B. 90% tesouro SELIC, 9% indexados e prefixados, 1% BOVA11
C. 80% tesouro SELIC, 10% títulos de tesouro indexados e prefixados, 7% BOVA11 e 3% SMAL11
A alocação didática que eu fiz é questionável, mas eu acho que para começar podemos pensar assim.
O ponto duplo da Barbell é: (1) os modelos que usamos para entender a Economia são frágeis, uma vez que as hipóteses utilizadas são baseadas em sistemas lineares, funções simples, um ferramental bastante limitado para lidar com problemas econômicos, que além de não serem adequados, ainda deixam o seguidor menos protegido diante de crises, (2) não existem investimentos "meio seguros", ou é extremamente seguro, ou tem risco e como o risco é difícil de calcular (afinal pelo ponto 1, os modelos não são confiáveis), então é melhor buscar relações entre risco e retorno mais agressivas e diversificadas, pois diante de uma crise se você tiver 10 ações arriscadas, pode ser que 8 quebrem e as outras 2 se valorizem de maneira a compensar e muito a valorização das 8 que quebraram. Pelo item 2, podemos abandonar renda fixa boa, como crédito privado, ou ações de empresas tradicionais, que são mais suscetíveis a crises como a de 2008.
Com isso em mente, eu pensei: "mas espera um pouco, não estou gastando meu tempo de maneira incorreta? E se eu aplicasse isso a minha linha do tempo?"
A analogia é que os tempos futuros mais próximos do presente são aqueles mais "garantidos" e aqueles mais distantes são mais arriscados. Se pensarmos em FIRE x INSS é extremamente arriscado para um investidor, esperar até os 65 anos para conseguir uma aposentadoria, porque no decorrer dos anos, talvez décadas, até alcançar essa idade existe o risco de doenças e acidentes, que podem frustrar o plano de consumir mais tarde, ou seja de deixar de consumir hoje e investir na esperança de ter uma vida melhor com menos privações no futuro. Em 2017, quando pensei nisso eu ainda não me baseava na filosofia FIRE, mas apenas estava pensando em uma analogia do Break-Even Point, mas se formos pensar, essa filosofia é um pouco Anti-FIRE, ou melhor ela adiciona uma camada de responsabilidade ao FIRE.
Se pegarmos um adulto de 31 anos podemos estimar de maneira otimista que ele viva por 100 anos, portanto ainda possui 69 anos de vida. Desses 69 anos, podemos arbitrar pensando em uma alocação C, que 80% desse tempo, intervalo de 55 anos, ele viverá da forma como sempre viveu, portanto com consumo padrão; os 10% seguintes, intervalo de 7 anos, ele deve viver de maneira um pouco mais intensa, para equilibrar o risco de ele perder a vida dentro dos 55 anos anteriores, por "intensa" podemos entender com menos privação de consumo, portanto com um consumo padrão mais elevado. Para os intervalos de 7% e de 3%, respectivamente 5 e 2 anos, a ideia é reduzir ainda mais a privação de consumo.
E em idos de 2017 foi mais ou menos isso que eu fiz, entretanto eu não pensei dessa maneira explícita e bem raciocinada. Eu simplesmente pensei que tinha que viver em intervalos crescentes de tempo, portanto eu tinha que simular um estilo de vida como se fosse morrer em uma semana, depois 3 dias, em seguida 1 semana, na sequência 2 semanas, logo depois 1 mês, aumentando até chegar em 6 meses, entretanto, essa lógica acabava quebrando completamente a ideologia frugal de FIRE. Na época, acabei desistindo depois de 4 meses por questões de saúde mental, mas fiquei com a ideia na cabeça porque ainda me pareceu coerente.
Não sei se ficou claro ainda, mas a ideia é ter um consumo mais elevado nos tempos mais recentes. Dessa maneira quanto mais quente a cor da tabela abaixo, maior o consumo no ano correspondente. Isso derivaria uma aplicação do networthify de Money Moustache ou do termômetro fire do aa40 sucessivas vezes. Entretanto, eu prefiro para esses casos aplicar a calculadora de independência financeira do André do Viagem Lenta. Acredito que as liberdades financeiras do tipo TSR são muito conservadoras no sentido de não ficar sem grana, porém mais agressivas no que diz respeito a guardar grana, ou ter mais retorno de investimento, porque o TSR é um modelo mais seguro nesse sentido. AA40 fez um excelente post sobre como usar a TSR na vida real, ler ajuda a pensar como funciona na prática. A lógica do André do Viagem Lenta é mais parecida com a que eu adotava antes de ter contato com o estudo Unity e outros, que é basicamente ver quanto sua grana rende a cada ano e se isso cobre seus custos, levando ainda em conta o consumo do patrimônio durante o período de vida.
Em uma conversa com um amigo que hoje trabalha na área de finanças, ele gostou da ideia, mas argumentou que a visão era muito focado no curto-prazo. Acabei concordando com ele, que eu deveria refinar o modelo, porque o ciclo econômico e a valorização das ações, carro-chefe da valorização do portfólio demoram de 3 anos para mais, para se valorizarem.
Ainda estou refinando a estratégia
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